2º Médio


LITERATURA – PROFESSORA GÉSSICA A SANTOS

HISTÓRIA SOCIAL DO REALISMO, DO NATURALISMO E DO PARNASIANISMO
Realismo é uma reação contra o Romantismoo Romantismo era a apoteose do sentimento; - o Realismo é a anatomia do caráter. É a crítica do homem. É a arte que nos pinta a nossos próprios olhos - para condenar o que houve de mau na nossa sociedade.
Eça de Queiroz

Estabeleceu-se há alguns anos uma escola monstruosa de romancistas, que pretende substituir a eloqüência da carnagem pela eloqüência da carne, que apela para as curiosidades mais cirúrgicas, que reúne pestíferos para nos fazer admirar as veias saltadas, que se inspira diretamente do cólera, seu mestre, e que faz sair pus da consciência. (…) Thérèse Raquin é o resíduo de todos esses horrores publicados precedentemente. Nele, escorrem todo o sangue e todas as infâmias… (Ferragus, crítico do séc. XIX)

Na segunda metade do século XIX, o  contexto sociopolítico europeu mudou profundamente. Lutas sociais, tentativas de revolução, novas ideias políticas, científicas... O mundo agitava-se, e a literatura não podia mais, como no tempo do Romantismo, viver de idealizações, do culto do eu e da fuga da realidade. Era necessária uma arte mais objetiva, que atendessse ao desejo do momento: o de analisar, compreender, criticar e transformar a realidade. Como resposta a essa necessidade, surgiram quase ao mesmo tempo três tendências antirromânticas na literatura, que se entrelaçavam e se influenciavam mutuamente: o Realismo, o Naturalismo e o Parnasianismo.

A LINGUAGEM DO REALISMO, DO NATURALISMO E DO PARNASIANISMO
Motivados pelas teorias científicas e filosóficas da época, os escritores realistas se empenharam em retratar o homem e a sociedade em conjunto. Não bastava mostrar a face sonhadora e idealizada da vida, como haviam feito os românticos; era preciso mostrar a face do cotidiano massacrante, do casamento por interesse, do amor adúltero, da falsidade e do egoísmo, da impotência do ser humano comum diante dos poderosos.

Na segunda metade do século XIX, a literatura europeia buscou novas formas de expressão, sintonizadas com as mudanças que ocorriam em diferentes setores: filosófico, político, econômico e cultural. A renovação na literatura manifestou-se na forma de três movimentos literários distintos na França: o Realismo, o Naturalismo e o Parnasianismo. O Realismo teve início com a publicação de Madame Bovary (1857), de Gustave Flaubert; o Naturalismo, com a publicação de Thérese Raquin (1867), Émile Zola; e o Parnasianismo, com a publicação das antologias parnasianas intituladas Parnasse Contemporain (a partir de 1866).
Embora guardem diferenças formais e ideológicas, essas três tendências apresentaram alguns aspectos em comum: o combate ao Romantismo, o resgate do objetivismo na literatura e o gosto pelas descrições.
De modo geral, pode-se dizer que o Naturalismo é uma espécie de Realismo científico, enquanto o Parnasianismo é um retorno da poesia ao estilo clássico, abandonado pelos românticos.

O REALISMO E OS REALISMOS DE TODOS OS TEMPOS
Os críticos Antonio Candido e José Aderaldo Castello explicam por que o uso da palavra Realismo para designar o movimento literário da segunda metade do século XIX é inadequado.

A designação de Realismo, dada a esse movimento, é inadequada, pois o realismo ocorre em todos os tempos como um dos pólos da criação literária, sendo a tendência para reproduzir nas obras os traços observados no mundo real – seja nas coisas, seja nas pessoas e nos sentimentos. Outro polo é a fantasia. Isto é, a tendência para inventar um mundo novo, diferente e muitas vezes oposto às leis do mundo. Os autores e as modas literárias oscilam incessantemente entre ambos, e é da sua combinação mais ou menos variada que se faz a literatura.
Livro: Presença da literatura brasileira

A prosa realista do séc. XIX denunciou em muitas obras a situação de submissão em que viviam as mulheres e as consequências negativas que dela advinham, como morte, humilhação, solidão. Veja nos textos a seguir, de escritores dessa escola literária, as referências feitas a mulheres:

Seu rosto é branco, repousado, calmo. Sua voz é suave e re­colhida, suas maneiras são simples. Tem todas as nobre­zas da dor, a santidade de uma pessoa que não maculou a alma ao contato do mundo, mas também a rigidez de solteirona e os hábitos mesquinhos que dá a existência estreita da província. Apesar de suas oitocentas mil libras de renda, vive como vivera a pobre Eugênia Grandet, só acende o fogo em seu quarto nos dias em que outrora seu pai lhe permitia acender o fogão da sala, e apaga-o conforme o programa em vigor nos seus jovens anos. Está sempre vestida como se vestia sua mãe. A casa de Saumur, casa sem sol, sem calor, sempre sombria, me­lancólica, é a imagem de sua vida.
Honoré de Balzac. Eugénie Grandet.
Como síntese, compare as características do Realismo com as do Romantismo.
REALISMO
ROMANTISMO
Objetivismo
Subjetivismo
Descrições e adjetivações objetivas, voltadas a captar o real como ele é
Descrições e adjetivações idealizantes, voltadas a elevar o objeto descrito
Mulher não idealizada, mostrada com defeitos e qualidades
Mulher idealizada, anjo de pureza e perfeição
Amor e outros sentimentos subordinados aos interesses sociais
Amor sublime e puro, acima de qualquer interesse
Herói problemático, cheio de fraquezas, manias e incertezas
Herói íntegro, de caráter irrepreensível
Narrativa lenta, acompanhando o tempo psicológico
Narrativa de ação e de aventura
Personagens trabalhadas psicologicamente
Personagens planas, de pensamentos e ações previsíveis
Universalismo
Individualismo, culto do eu (egocentrismo)

A LINGUAGEM DA PROSA NATURALISTA
Um procedimento característico da prosa naturalista é apresentar o ambiente físico e social detalhadamente, como se o narrador estivesse munido de uma máquina fotográfica com lentes do tipo zum, que lhe permitisse compor e decompor os detalhes de cada cena.
A linguagem da prosa naturalista caracteriza-se pela adoção de uma postura analítica e científica diante da realidade. Por isso, faz uso frequente da narração impessoal e de descrições minuciosas, com muitas sugestões visuais, olfativas, táteis e auditivas. Por conta desse detalhamento, a narrativa às vezes torna-se lenta.        
No Naturalismo, homens e mulheres são vistos por uma perspectiva biológica, em que se destaca seu lado físico, instintivo, animal, por vezes até degradante.

NATURALISMO x ROMANTISMO
Na segunda metade do século XIX, tanto o Realismo quanto o Naturalismo e o Parnasianismo combatiam o Romantismo. Mas cada uma dessas correntes se opunha ao movimento por razões diferentes. Veja como os críticos Antonio Candido e José Aderaldo Castello explicam a oposição do Naturalismo ao Romantismo.
“Naturalismo”, no sentido mais amplo, significou a busca de uma explicação materialista para os fenômenos da vida da vida e do espírito, bem como a redução dos fatos sociais aos seus fatores externos, sobretudo os biológicos, segundo os padrões definidos pelas ciências naturais. [...] O Romantismo foi combatido, entre outras coisas, no que tinha de compromisso com as filosofias de cunho espiritualista, e no que tinha de idealização da realidade.
Livro: Presença da literatura brasileira.


HOMEM: A RAÇA, O MEIO, O MOMENTO HISTÓRICO
Os naturalistas, com base nas ideias deterministas de Hippolyte Taine (1828-1893), viam o ser humano como uma máquina guiada pela ação das leis físicas e químicas, pela hereditariedade e pelo meio físico e social. As personagens aparecem, então, como produtos, como consequência de forças preexistentes que lhes roubam o livre-arbítrio e as tornam, em casos extremos, verdadeiros joguetes.

Como síntese, observe as características do Naturalismo:
Naturalismo
Quanto à forma
Quanto ao conteúdo
Linguagem simples
Determinismo
Clareza, equilíbrio e harmonia na composição
Objetivismo cinetífico
Preocupação com minúcias
Temas de patologia social
Presença de palavras regionais
Observação e análise da realidade
Descrição e narrativas lentas
Ser humano descrito sob a ótica do animalesco e do sensual
Impessoalidade
Despreocupação com a moral

Literatura engajada

NATURALISMO E O ROMANCE DE TESE
As obras naturalistas são também chamadas de romances de tese: apresentam um ponto de vista e tentam demonstrá-lo através dos fatos narrados. Em geral, focalizam o lado patológico dos indivíduos ou da sociedade, ou seja, as piores situações sociais, como: traição, atentado ao pudor, exploração sexual etc. Em seguida, procuram os motivos de tais problemas, encontrando-os na etnia, nos costumes, no ambiente social, no temperamento, na falta de valores morais e na libertinagem. Enfim, dissecavam as taras humanas, vistas como consequências da hereditariedade, de doenças, vícios, má formação do caráter e das relações sociais....

Além de romances de tese, o naturalismo pode ser chamado romances experimentais, onde seus fatos são usados como experiências científicas e, assim, é apresentada uma conclusão.
O Naturalismo defende a exposição do ser humano através de seus instintos naturais, sendo estes responsáveis por seus atos. A literatura naturalista tem caráter reformista, uma vez que seus escritores passaram a analisar o comportamento humano e social, de maneira que eram capazes se apontar saídas e soluções. Antônio Cândido e José Geraldo Castelo (1994:286) assim explicam o Naturalismo:

O Naturalismo significa o tipo de Realismo que procura explicar cientificamente a conduta e o modo de ser dos personagens por meio dos fatores externos, de natureza biológica e sociológica, que condicionam a vida humana. Os seres aparecem então, como produtos, como conseqüências de fatores preexistentes, que limitam a sua responsabilidade e os tornam, nos casos mais extremos, verdadeiros joguetes das condições.
Os naturalistas acreditavam que o conhecimento se dá por meio dos sentidos e que a função do escritor é relatar por detalhes o que se observa. Sua teoria de vida era mais pessimista que a dos realistas. Mas o Naturalismo nada mais é do que o Realismo mais cientificismo da segunda metade do século XIX. Assim, encontramos todas as características do Realismo, exceto a análise psicológica das personagens.

A LINGUAGEM DA POESIA PARNASIANA
Enquanto o Realismo e o Naturalismo tiveram em comum a finalidade de analisar e compreender a realidade, o Parnasianismo foi uma tendência com perspectiva completamente diferente.
                O Parnasianismo é um movimento literário que surgiu na mesma época do Realismo e do Naturalismo, no final do século XIX. De influência e tradição clássica, tem origem na França.
Seu nome surge de Parnase Contemporain, antologias publicadas em Paris a partir de 1866. Parnaso é como se chama a montanha consagrada a Apolo e às musas da poesia na mitologia grega.
Em 1882, Fanfarras, de Teófilo Dias, é a obra que inaugura o parnasianismo brasileiro, movimento que se prolonga até a Semana de Arte Moderna, em 1922.
De postura antirromântica, o Parnasianismo é baseado no culto da forma, na impassibilidade e impessoalidade, na poesia universalista e no racionalismo.
Os autores parnasianos criticavam a simplicidade da linguagem, a valorização da paisagem nacional e o sentimentalismo. Para eles, essa era uma forma de subjugar os valores da poesia.
A proposta inovadora era de uma poesia de linguagem rebuscada, racional e perfeita do ponto de vista formal. Acreditavam que, se estivesse apoiados no modelo clássico poderiam contrapor os exageros e a fantasia típica do movimento literário Romantismo.
Ao Parnasianismo, seguiu-se o Simbolismo, movimento que exalta a realidade subjetiva e que nega a razão explorada pelos parnasianos.
Em resumo, as características do Parnasianismo são:
·           Idealização da arte pela arte
·           Busca da perfeição formal
·           Preferência pelo soneto
·           Preferência pela descrição
·           Rimas raras
·           Vocabulário culto
·           Objetivismo
·           Racionalismo
·           Universalismo
·           Apego à tradição clássica
·           Gosto pela mitologia greco-latina
·           Rejeição do lirismo

Exemplo de poemas Parnasianos:


PROFISSÃO DE FÉ – OLAVO BILAC
Invejo o ourives quando escrevo:
Imito o amor
Com que ele, em ouro, o alto relevo
Faz de uma flor.
Imito-o. E, pois, nem de Carrara
A pedra firo:
O alvo cristal, a pedra rara,
O ônix prefiro.
Por isso, corre, por servir-me,
Sobre o papel
A pena, como em prata firme
Corre o cinzel.
Corre; desenha, enfeita a imagem,
A idéia veste:
Cinge-lhe ao corpo a ampla roupagem
Azul-celeste.
Torce, aprimora, alteia, lima
A frase; e, enfim,
No verso de ouro engasta a rima,
Como um rubim.
Quero que a estrofe cristalina,
Dobrada ao jeito
Do ourives, saia da oficina
Sem um defeito:
E que o lavor do verso, acaso,
Por tão subtil,
Possa o lavor lembrar de um vaso
De Becerril.
E horas sem conto passo, mudo,
O olhar atento,
A trabalhar, longe de tudo
O pensamento.
Porque o escrever - tanta perícia,
Tanta requer,
Que oficio tal... nem há notícia
De outro qualquer.
Assim procedo. Minha pena
Segue esta norma,
Por te servir, Deusa serena,
Serena Forma!



VASO CHINÊS – ALBERTO DE OLIVEIRA
Estranho mimo aquele vaso! Vi-o,
Casualmente, uma vez, de um perfumado
Contador sobre o mármor luzidio,
Entre um leque e o começo de um bordado.

Fino artista chinês, enamorado,
Nele pusera o coração doentio
Em rubras flores de um sutil lavrado,
Na tinta ardente, de um calor sombrio.

Mas, talvez por contraste à desventura,
Quem o sabe?... de um velho mandarim
Também lá estava a singular figura;

Que arte em pintá-la! a gente acaso vendo-a,
Sentia um não sei quê com aquele chim
De olhos cortados à feição de amêndoa.


Indicações de leituras sobre os autores do Realismo/Naturalismo/Parnasianismo:


HISTÓRIA SOCIAL DO SIMBOLISMO
O fato de uma estética literária vigorar em determinado momento histórico não significa que todas as pessoas e grupos sociais daquele momento tenham vivido e pensado da mesma forma. Pode-se dizer que nas épocas históricas há uma ideologia predominante, mas não global.
Nas últimas décadas do século XIX, por exemplo, em meio à onda de cientificismo e materialismo que deu origem ao Realismo e ao Naturalismo, surgiu um grupo de artistas e intelectuais que punham em dúvida a capacidade absoluta da ciência de explicar todos os fenômenos relacionados ao homem. Não acreditavam no conhecimento “positivo” e no progresso social prometidos pela ciência.
Pensavam que, assim como a ciência, a linguagem é limitada. A primeira, para traduzir a complexidade humana, e a segunda, para representar a realidade como ela de fato é, podendo, no máximo, sugeri-la.
Estudar a literatura do período implica conhecer a crise espiritual que marcou esse momento histórico e ver de que modo ela acarretou uma nova forma de ver e sentir o mundo e, consequentemente, uma nova forma de expressão artística: a arte simbolista.

A LINGUAGEM DO SIMBOLISMO
Embora acentue sob alguns aspectos o requinte da arte pela arte, o Simbolismo se opõe tanto ao Realismo quanto ao Parnasianismo, situando-se muito próximo das orientações românticas, de que é em parte uma revivescência. Antonio Candido e José Aderaldo Castello
Tanto o Simbolismo francês quanto o brasileiro foram fortemente influenciados pela obra de Charles Baudelaire (1821-1867), poeta pós-romântico francês considerado precursor não apenas do Simbolismo, mas de toda a poesia moderna.
A linguagem simbolista caracteriza-se por ser vaga, fluida, imprecisa.
Para os simbolistas, uma das formas de expressar as sensações interiores  por meio da linguagem verbal é a aproximação ou o cruzamento de campos sensoriais diferentes. Esse procedimento, a que se dá o nome de SINESTESIA, foi inspirado no poema “Correspondências” de Baudelaire.
O Parnasianismo e o Simbolismo nasceram juntos, na França, com a publicação da revista Parnasse Contemporain. Embora esses dois movimentos apresentem propostas artísticas diferentes, eles têm em comum a preocupação coma própria linguagem artística. Por isso é comum se manifestar entre simbolistas o principio da “arte pela arte” ou “arte sobre a arte”.

SIMBOLISMO: O MUNDO EM CRISE
O Simbolismo é um movimento que atravessa o final do século XIX, e que exprime a tonalidade espiritual de uma época, conciliando o cosmos e a psique. A experiência poética associa-se, então, à meditação metafísica. A beleza torna-se um ideal, com a rejeição lógica da sociedade “burguesa”. Há um desencanto generalizado, o mundo entra em crise, o escritor afirma-se “decadente”, e refugia-se num universo imaginário, construindo uma filosofia do nada, do aniquilamento, da desesperança e do cepticismo. Izabel Pascoal.

OS SIMBOLISTAS E OS GÓTICOS
O Simbolismo retoma alguns dos procedimentos românticos, entre eles o subjetivismo, o gosto pelo mistério, pelo macabro e por ambientes noturnos. Veja o que o simbolista francês Rimbaud escreveu:
Deveria ter meu inferno pela cólera, meu inferno pelo orgulho, - e o inferno da carícia: um concerto de infernos. Morro de lassidão. É a tumba, vou para os vermes, o horror dos horrores! Satã, farsante, queres me diluir com teus feitiços. Me queixo. Me queixo! Um golpe do tridente, uma gota do fogo. (Uma temporada no inferno – Rimbaud)
Indicação de filme: Eclipse de uma paixão (1997) – narra o intenso relacionamento afetivo e poético vivido pelos poetas simbolistas franceses Verlaine e Rimbaud. Com apenas 16 anos, Rimbaud já surpreendia os meios literários franceses com suas ideias originais e com sua forma particular de conceber a poesia.
Compare as características do Simbolismo com o Parnasianismo:
SIMBOLISMO
PARNASIANISMO
Subjetivismo
Objetivismo
Linguagem vaga, fluida, busca “sugerir” em vez de nomear
Linguagem precisa, objetiva, culta
Cultivo do soneto e de outras formas de composição poética
Preferência pelo soneto
Antimaterialismo, antirracionalismo
Racionalismo
Misticismo, religiosidade
Paganismo greco-latino
Pessimismo, dor de existir
Contenção dos sentimentos
Estados contemplativos, interesse pelo noturno, pelo mistério, pela morte
Interesse por temas universais: a natureza, o amor, objetos de arte, a poesia
Retomada de elementos da tradição romântica
Retomada de elementos da tradição clássica

SIMBOLISMO E DECADENTISMO
A poesia universal é toda ela na essência simbólica. Os símbolos povoam a literatura desde sempre. [...] Todavia, ao longo da década de 1890, desenvolveu-se na França um movimento estético a princípio apelidado “decadentismo” e depois “Simbolismo”. Por muitos aspectos ligados ao Romantismo e tendo tido berço comum com o Parnasianismo, o Simbolismo gerou-se como uma reação contra a fórmula estética parnasiana, que dominara a cena literária durante a década de 1870, ao lado do Realismo e do Naturalismo, defendendo o impessoal, o objetivo, o gosto do detalhe e da precisa representação da natureza [...]
Posto não constituísse uma unidade de métodos, antes de ideais, o Simbolismo procurou instalar um credo estético baseado no subjetivo, no pessoal, na sugestão e no vago, no misterioso e ilógico, na expressão indireta e simbólica. Como pregava Mallarmé, não se devia dar nome ao objeto, nem mostrá-lo diretamente, mas sugeri-lo, evocá-lo pouco a pouco, processo encantatório que caracteriza o símbolo. (Afrânio Coutinho)

SIMBOLISMO: REAÇÃO AO RACIONALISMO
Visto à luz da cultura europeia, o Simbolismo reage às correntes analíticas dos meados do século (XIX), assim como o Romantismo reagira à Ilustração [...] Ambos os movimentos exprimem o desgosto das soluções racionalistas e mecânicas e nestas reconhecem o correlato da burguesia industrial em ascensão: ambos recusam-se a limitar a arte ao objeto, à técnica de produzi-lo, a seu aspecto palpável; ambos, enfim, esperam ir além do empírico e tocar, com a sonda da poesia, um fundo comum que susteria os fenômenos, chama-se Natureza, Absoluto, Deus ou Nada. (Alfredo Bosi)

O SIMBOLISMO E O TÉDIO DA CIVILIZAÇÃO MODERNA
Ao mesmo tempo, e em íntima relação com o movimento dos parnasianos, o culto da sensação evolui de outra maneira bem mais interessante; alguns poetas, experimentando conhecidas ou pelo menos inexpressas sensações, sugeridas amiúde pelo tédio da civilização moderna e pelo seu sentimento de expatriação no seio dela, e não encontrando mais, nas formas usuais de linguagem poética, instrumentos capazes de satisfazer sua vontade de expressão, começavam a modificar profundamente a função da palavra em poesia. Essa função é dupla, e o foi em todos os tempos: em poesia, a palavra não é somente o instrumento da compreensão racional, tem outrossim o poder de evocar sensações. (Erich Auerbach)

SIMBOLISMO: A ARTE DE SUGERIR
Embora acentue sob alguns aspectos o requinte da arte pela arte, o simbolismo se opõe tanto ao realismo quanto ao parnasianismo, situando-se muito próximo das orientações românticas, de que é em parte uma revivescência. Não aceitando a separação entre sujeito e objeto, entre artista e assunto, mas ele objetivo e subjetivo se fundem, pois o mundo e a alma têm infinidades misteriosas, e as coisas mais díspares podem revelar um parentesco inesperado. O espírito, portanto, não apreende totalmente nem traça um contorno firme dos objetos, dos seres, das ideias. Cabe-lhes apenas o recurso de aproximar-se da sua realidade oculta por meio de tentativas, que sugerem sem esgotá-la.

O SIMBOLISMO NO BRASIL
Ao contrário do que ocorreu na Europa, onde o Simbolismo se sobrepôs ao Parnasianismo, no Brasil o movimento simbolista foi quase inteiramente ofuscado pelo movimento parnasiano, que gozou de amplo prestígio entre as camadas cultas da sociedade até as primeiras décadas do século XX. Apesar disso, a produção simbolista deixou contribuições significativas, preparando terreno para as grandes inovações que iriam ocorrer no século XX, no domínio da poesia.
As primeiras manifestações simbolistas já eram sentidas no Brasil desde o final da década de 80 do século XIX. Apesar disso, tem-se apontado como marco introdutório do movimento simbolista brasileiro a publicação, em 1893, das obras Missal (prosa) e Broquéis (poesia), de nosso maior autor simbolista: Cruz e Souza.
Além de Cruz e Souza, destacam-se, entre outros, Alphonsus de Gumaraens e Pedro Kilkerry (recentemente descoberto pela crítica).

CRUZ E SOUSA: O CAVADOR DO INFINITO
Cruz e Sousa (1861 -1898) nasceu em Florianópolis, Santa Catarina. Filho de escravos, foi amparado por uma família aristocrática, que o ajudou nos estudos. Com a morte do protetor, abandou os estudos e começou a trabalhar na imprensa catarinense, escrevendo crônicas abolicionistas e participando diretamente de campanhas em favor da causa negra. Ele próprio mais de uma vez fora vítima de preconceito racial. Em 1890, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde sobreviveu trabalhando em vários empregos. Depois de ter tido na juventude uma grande desilusão amorosa, ao apaixonar-se por uma artista branca, casou-se com Gravita, uma negra que, anos depois, manifestou problemas mentais. Dos quatro filhos que o casal teve, apenas dois sobreviveram. Cruz e Souza morreu aos 36 anos, vítima de tuberculose. Suas únicas obras publicadas em vida são Missal e Broquéis.
Hoje, Cruz e Sousa é considerado o mais importante poeta simbolista brasileiro e um dos maiores poetas nacionais de todos os tempos. Contudo, o escritor só teve seu valor reconhecido postumamente, depois de ter sido incluído pelo sociólogo francês Roger BAstide entre os maiores poetas do Simbolismo universal.
Sua obra poética apresenta diversidade e riqueza. De um lado, encontram-se nela aspectos noturnos do Simbolismo, herdados do Romantismo: o culto da noite, certo satanismo, o pessimismo, a morte.
De outro lado, há certa preocupação formal, que aproxima o poeta dos parnasianos: a forma lapidar, o gosto pelo soneto, o verbalismo requintado, a força das imagens; há, ainda, a inclinação à poesia meditativa e filosófica, que o aproxima da poesia realista portuguesa.

A POESIA METAFÍSICA E A DOR DE EXISTIR
Juntamente com o poeta realista portuguesa Antero de Quental e o pré-modernista brasileiro Augusto dos Anjos, Cruz e Sousa apresenta uma das poéticas de maior profundidade em língua portuguesa, em razão da investigação filosófica e da angústia metafísica presentes nas suas composições.
Na obra de Cruz e Sousa, o drama da existência revela uma provável influencia das ideias pessimistas do filosofo alemão Schopenhauer, que marcaram o final do século XIX. Além disso, certas posturas verificadas em sua poesia – o desejo de fugir da realidade, de transcender a matéria e integrar-se espiritualmente no cosmo – parecem originar-se não apenas do sentimento de opressão e mal-estar produzido pelo capitalismo, mas também do drama racial e pessoal que o autor vivia.
A trajetória da obra de Cruz e Sousa parte da consciência e da dor de ser negro, em Broquéis, e chega à dor de ser homem, em Faróis e Últimos sonetos, obras póstumas nas quais sobressai a busca da transcendência.
As características mais importantes da poesia de Cruz e Sousa são>
- no plano temático: a morte, a transcendência espiritual, a integração cósmica, o mistério, o sagrado, o conflito entre matéria e espírito, a angústia e a sublimação sexual, a escravidão e uma verdadeira obsessão por brilhos e pela cor branca.
- no plano formal: as sinestesias, as imagens surpreendentes, a sonoridade das palavras, a predominância de substantivos e adjetivos e o emprego de maiúsculas, utilizadas com a finalidade de dar valor absoluto a certos termos.

ALPHONSUS DE GUIMARAENS
Alphonsus de Guimaraens (1870-1921) nasceu em Ouro Preto, estudou Direito em São Paulo e durante muitos anos foi juiz em Mariana, cidade histórica vizinha de Ouro Preto.
Marcado ainda muito jovem pela morte da prima Constança, a quem amava e que tinha apenas 17 anos, sua poesia é quase toda voltada para o tema da morte da mulher amada. Todos os outros temas que explorou, como natureza, arte e religião, estão de alguma forma relacionados ao primeiro.
A exploração do tema da morte abriu ao poeta, por um lado, o vasto campo da literatura gótica ou macabra dos escritores ultrarromânticos, recuperada por alguns simbolistas; por outro lado, possibilitou a criação de uma atmosfera mística e litúrgica, em que abundam referências ao corpo morto, ao esquife, às orações, às cores roxa e negra, ao sepultamento, conforme exemplifica esta estrofe:
Mãos de finada, aquelas mãos de neve,
De tons marfíneos, de ossatura rica,
Pairando no ar, num gesto brando e leve,
Que parece ordenar mas que suplica.

O conjunto de poesias de Alphonsus de Guimaraens é uniforme e equilibrado. Temas e formas se repetem e se aprofundam no decorrer de quase trinta anos de produção literária, consolidando uma de nossas poéticas mais místicas e espiritualistas.
O crítico Alfredo Bosi considera que “ de Cruz e Sousa para Alphonsus de Guimaraens sentimos uma descida de tom”; isso porque a universalidade, a dor da existência e as sensações de voo e vertigem que caracterizam a linguagem simbolista de Cruz e Sousa ganham limites mais estreitos na poesia de Alphonsus, presa ao ambiente místico da cidade de Mariana e ao drama vivido na adolescência.
Formalmente o poeta revela influências árcades e renascentistas, sem, contudo, cair no formalismo parnasiano. Embora preferisse o verso decassílabo, Alphonsus chegou a explorar outras métricas particularmente a redondilha maior, de longa tradição popular, medieval e romântica.

  


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